sábado, 19 de novembro de 2016

A prisão dos Excluídos: Origens e reflexões sobre a pena privativa de liberdade

(Resenha)


A prisão dos Excluídos: Origens e reflexões sobre a pena privativa de liberdade[1]
Por Ricardo Oliveira[2]


Bem, antes de iniciarmos nossas reflexões, gostaria de pedir desculpas pela ausência de três meses do blog visto as demandas profissionais não menos importantes que este espaço de produção do conhecimento.
            Sobre um tema que a meu ver, tem repercutido incessantemente em nossa sociedade gerando polêmicas, tentaremos construir uma temática elucidativa no que concerne a pena privativa de liberdade em nosso país, com vistas a refletirmos até que ponto o sistema carcerário brasileiro funciona adequadamente e atende efetivamente as demandas sociais.
            Trabalharemos especificamente apenas com o primeiro capítulo da obra que recebe o título proposto a fim de não nos estendermos muito, pois esse não é o nosso objetivo.
            Percebi que, ocorrido o último pleito na cidade do Rio de Janeiro, uma série de manifestações explícitas em torno da questão abordada girava em torno do jargão “bandido bom, é bandido morto!” Pois bem! Observando as mídias sociais, verifiquei a ampla difusão de um discurso de ódio, pavimentando o pensamento das pessoas de maneira ostensiva e arbitrária, desconsiderando opiniões contrárias plausíveis e até certo ponto fundamentadas.
            Existem uma série de questões, sobretudo alinhavadas ao nosso modo de produção capitalista que nos leva a considerar certos aspectos que não podem ou não devem ser ignorados quando o assunto é liberdade ou privação dela.
            Dessa maneira, me senti compelido a trazer luz a estas questões para ampliarmos o debate, mas de forma conceitual, sistemática e, sobretudo construtiva.
            Parece-me óbvio que ao sairmos de casa, no cotidiano da cidade em que vivemos, estamos suscetíveis a uma gama de possibilidades que podem ser causadoras de conflitos que podem gerar em nós uma súbita atitude considerada dentro do nosso sistema jurídico uma infração, ou seja, uma pena a ser paga perante a sociedade.
            Dito isso, consideraremos nossas atitudes baseadas também no acelerado processo de troca de informação, trabalho, família, lazer e outros. O sistema econômico em que vivemos, possui suas nuances pautadas nesse turbilhão de situações que nos é demandada, e com isso, tornamo-nos presas fáceis em potencial para agirmos de forma equivocada, sem levar em consideração as consequências.
            Sendo assim, analisaremos a correlação entre o tema proposto e o sistema econômico pois como dito anteriormente em linhas gerais, existe uma “violência” por assim dizer, que no nível do senso comum é quase imperceptível.
            Karl Marx, por diversas vezes e, eu diria até os dias de hoje, é/foi acusado de ser um “vagabundo” sustentado por terceiros em sua vida material. Mas aí o leitor me questionaria: O que isso tem a ver com a História? De forma resumida se de fato ele não se sustentava materialmente, o tempo “livre” do qual ele dispunha fez-se útil e necessário para que ainda no século XVIII, ele pudesse efetivamente analisar as profundas transformações pela qual passava a sociedade daquela época.
            Em sua obra magna, O Capital, em seus momentos de “ócio intelectual” percebeu que o sistema capitalista articulava-se com instituições como o Estado burguês na forma da prisão criada e recriada e até a igreja visando, sobretudo punir, guardar, assistir e encaminhar os agora trabalhadores “livres” ao trabalho forçado. Assim descrito:

“O contexto percebido por Marx é o da prisão criada e recriada, multiplicada e articulada com a economia capitalista, o Estado burguês, a igreja reformada e em reforma. Nessas condições as instituições carcerárias visavam, sobretudo, punir, guardar, assistir disciplinar e encaminhar os recalcitrantes à forca ou ao trabalho forçado” (Sá,1996, pg 15).


            No parágrafo acima observe o leitor que coloquei livre entre aspas, pois imagine agora a seguinte situação: Você detentor dos meios de produção (em comparação grosseira com um profissional liberal qualquer nos dias atuais) agora sem seus utensílios e ferramentas de trabalho e terra para produzir, agora “livre” para submeter-se ao novo modelo econômico.
            Dessa maneira, no contexto da época, destituídos da terra para produzirem e, de suas ferramentas, camponeses tornaram-se trabalhadores “livres” dentro das relações de produção de maneira que, sem que lhes restassem alternativas, agora disponíveis ao mercado como força de trabalho ou a compor uma parcela de excedentes enquanto trabalhadores.  
            É valido ainda lembrar que o novo sistema é composto de três elementos básicos para seu funcionamento que se seguem: a produção, a distribuição e a circulação/consumo.
Senso assim, o modo capitalista definiu-se da forma descrita a seguir:

“O modo capitalista de produzir, circular e consumir riquezas, ao se constituir  nas cidades e retornar ao campo, expropriou, expulsou e degradou camponeses. Transformou-os, juntamente com outros setores da população, em trabalhadores livres de suas ferramentas e objetos de trabalho, agora ”disponíveis”[grifo nosso] e dispostos a servir ao empregador, onde este se encontrasse. Ou ainda, livres para vegetar na indigência ou compor excedentes do mercado de trabalho.” (Sá, 1996,pg 15).

            Porque tecemos essas considerações ao falarmos do tema em questão? Porque segundo (Sá,1996,pg.16):Marx distinguiu dois mecanismos de repressão: a coação das relações econômicas e a violência direta[3], sendo ambas constitutivas da sociedade capitalista.
            Dessa forma, podemos presumir que, devido ao fato de trabalhadores destituídos agora do seu modus faciendi, submetidos a novas formas de trabalho e produção, encontram-se inseridos num contexto histórico, no qual não podem desvencilhar-se e seu excedente de mão-de-obra potencialmente exposto à condição de subempregados ou desempregados literalmente como descrito a seguir:

“Vagabundos, mendigos e vadios sempre existiram em muitos lugares. Porém este segmento marginal estava recebendo novos componentes[...]recém chegados , outrora inseridos nas estruturas produtivas feudais, em decomposição, viam suas ferramentas hábitos e cultura ser “inúteis” [grifo nosso] perante a nova maneira de produzir  e reproduzir riquezas” (Sá, 1996,pg 18).

            Nesse sentido, pensamos agora que trabalhadores até então que dispunham de maneiras de prover sua subsistência agora se tornaram “potencialmente” vagabundos, marginais e um sem fim de nomenclaturas para configurar a nova condição em que se encontram.
            Ora, pois que temos que nos dias atuais, não é muito diferente da realidade vivida pelos camponeses daquela época, pois que o nosso sistema capitalista é incapaz de absorver toda a mão de obra disponível para a relação direta com o mercado e a economia de maneira geral.
           
            Também me parece óbvio que não necessariamente a potencialidade do ser humano agora desprovido de manter sua subsistência, tornar-se um marginal [grifo nosso], efetivamente se tornará pois que esta questão envolve dimensões psíquicas, psicológicas e tantas outras subjetividades atreladas a forma ontológica do ser.
            Então porque resolvi explorar essa questão? Penso que a problemática envolvida no processo perpassa não somente pelo modelo econômico no qual estamos inseridos, mas também em grande parte ou em certa medida pela interpretação de nossas leis e afirmo que o problema não se encerra na mesma pura e simplesmente por possíveis fragilidades que possam apresentar, mas também entendo que os magistrados em nosso país, têm alguma dificuldade em lidar com situações diria numa dimensão teológica numa relação de juízo de valor, pois que não existe “pecadinho e pecadão” e dessa forma, a subjetividade na formação humana do magistrado poderia influenciar de maneira substancial na interpretação da lei.
            Em resumo: vale o que está escrito, mas “normalmente” para os explorados expropriados e destituídos dos interesses do sistema.
           
           
           
           
             



           
           






[1] Geraldo Ribeiro de Sá, Juiz de fora- MG,UFJF,1996.
[2] Graduado em Ciências Sociais/Faculdade de Filosofia de Campo Grande e Pós Graduado em Diversidade Étnica e Educação Superior/UFRRJ.
[3] [...]as relações econômicas, tornando-se presente, inclusive  nos intercâmbios travados entre capitalistas –proprietários dos meios de produção  e compradores de força de trabalho, e os trabalhadores-donos de suas energias físicas e espirituais. A coação surda, presentes nas relações econômicas e jurídicas, transparece, inclusive nas demais “relações contratuais”, travadas no cotidiano do cidadão.

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