(Resenha)
A prisão dos
Excluídos:
Origens e reflexões sobre a pena privativa
de liberdade[1]
Por Ricardo Oliveira[2]
Bem,
antes de iniciarmos nossas reflexões, gostaria de pedir desculpas pela ausência
de três meses do blog visto as demandas profissionais não menos importantes que
este espaço de produção do conhecimento.
Sobre um tema que a meu ver, tem
repercutido incessantemente em nossa sociedade gerando polêmicas, tentaremos
construir uma temática elucidativa no que concerne a pena privativa de liberdade
em nosso país, com vistas a refletirmos até que ponto o sistema carcerário
brasileiro funciona adequadamente e atende efetivamente as demandas sociais.
Trabalharemos especificamente apenas
com o primeiro capítulo da obra que recebe o título proposto a fim de não nos
estendermos muito, pois esse não é o nosso objetivo.
Percebi que, ocorrido o último
pleito na cidade do Rio de Janeiro, uma série de manifestações explícitas em
torno da questão abordada girava em torno do jargão “bandido bom, é bandido morto!”
Pois bem! Observando as mídias sociais, verifiquei a ampla difusão de um discurso
de ódio, pavimentando o pensamento das pessoas de maneira ostensiva e
arbitrária, desconsiderando opiniões contrárias plausíveis e até certo ponto
fundamentadas.
Existem uma série de questões,
sobretudo alinhavadas ao nosso modo de produção capitalista que nos leva a
considerar certos aspectos que não podem ou não devem ser ignorados quando o
assunto é liberdade ou privação dela.
Dessa maneira, me senti compelido a
trazer luz a estas questões para ampliarmos o debate, mas de forma conceitual, sistemática
e, sobretudo construtiva.
Parece-me óbvio que ao sairmos de
casa, no cotidiano da cidade em que vivemos, estamos suscetíveis a uma gama de
possibilidades que podem ser causadoras de conflitos que podem gerar em nós uma
súbita atitude considerada dentro do nosso sistema jurídico uma infração, ou
seja, uma pena a ser paga perante a sociedade.
Dito isso, consideraremos nossas
atitudes baseadas também no acelerado processo de troca de informação,
trabalho, família, lazer e outros. O sistema econômico em que vivemos, possui
suas nuances pautadas nesse turbilhão de situações que nos é demandada, e com
isso, tornamo-nos presas fáceis em potencial para agirmos de forma equivocada,
sem levar em consideração as consequências.
Sendo assim, analisaremos a
correlação entre o tema proposto e o sistema econômico pois como dito
anteriormente em linhas gerais, existe uma “violência” por assim dizer, que no
nível do senso comum é quase imperceptível.
Karl Marx, por diversas vezes e, eu
diria até os dias de hoje, é/foi acusado de ser um “vagabundo” sustentado por
terceiros em sua vida material. Mas aí o leitor me questionaria: O que isso tem
a ver com a História? De forma resumida se de fato ele não se sustentava
materialmente, o tempo “livre” do qual ele dispunha fez-se útil e necessário
para que ainda no século XVIII, ele pudesse efetivamente analisar as profundas
transformações pela qual passava a sociedade daquela época.
Em sua obra magna, O Capital, em
seus momentos de “ócio intelectual” percebeu que o sistema capitalista
articulava-se com instituições como o Estado burguês na forma da prisão criada
e recriada e até a igreja visando, sobretudo punir, guardar, assistir e
encaminhar os agora trabalhadores “livres” ao trabalho forçado. Assim descrito:
“O contexto percebido
por Marx é o da prisão criada e recriada, multiplicada e articulada com a
economia capitalista, o Estado burguês, a igreja reformada e em reforma. Nessas
condições as instituições carcerárias visavam, sobretudo, punir, guardar,
assistir disciplinar e encaminhar os recalcitrantes à forca ou ao trabalho
forçado” (Sá,1996, pg 15).
No parágrafo acima observe o leitor
que coloquei livre entre aspas, pois imagine agora a seguinte situação: Você
detentor dos meios de produção (em comparação grosseira com um profissional
liberal qualquer nos dias atuais) agora sem seus utensílios e ferramentas de
trabalho e terra para produzir, agora “livre” para submeter-se ao novo modelo
econômico.
Dessa maneira, no contexto da época,
destituídos da terra para produzirem e, de suas ferramentas, camponeses
tornaram-se trabalhadores “livres” dentro das relações de produção de maneira
que, sem que lhes restassem alternativas, agora disponíveis ao mercado como força
de trabalho ou a compor uma parcela de excedentes enquanto trabalhadores.
É valido ainda lembrar que o novo sistema
é composto de três elementos básicos para seu funcionamento que se seguem: a
produção, a distribuição e a circulação/consumo.
Senso
assim, o modo capitalista definiu-se da forma descrita a seguir:
“O
modo capitalista de produzir, circular e consumir riquezas, ao se constituir nas cidades e retornar ao campo, expropriou,
expulsou e degradou camponeses. Transformou-os, juntamente com outros setores
da população, em trabalhadores livres de suas ferramentas e objetos de
trabalho, agora ”disponíveis”[grifo nosso]
e dispostos a servir ao empregador, onde este se encontrasse. Ou ainda, livres
para vegetar na indigência ou compor excedentes do mercado de trabalho.” (Sá,
1996,pg 15).
Porque tecemos essas considerações
ao falarmos do tema em questão? Porque segundo (Sá,1996,pg.16):Marx distinguiu dois mecanismos de
repressão: a coação das relações econômicas e a violência direta[3],
sendo ambas constitutivas da sociedade capitalista.
Dessa forma, podemos presumir que,
devido ao fato de trabalhadores destituídos agora do seu modus faciendi, submetidos a novas formas de trabalho e produção, encontram-se
inseridos num contexto histórico, no qual não podem desvencilhar-se e seu excedente
de mão-de-obra potencialmente exposto à condição de subempregados ou desempregados
literalmente como descrito a seguir:
“Vagabundos, mendigos e
vadios sempre existiram em muitos lugares. Porém este segmento marginal estava
recebendo novos componentes[...]recém chegados , outrora inseridos nas
estruturas produtivas feudais, em decomposição, viam suas ferramentas hábitos e
cultura ser “inúteis” [grifo nosso] perante a nova maneira de produzir e reproduzir riquezas” (Sá, 1996,pg 18).
Nesse sentido, pensamos agora que
trabalhadores até então que dispunham de maneiras de prover sua subsistência
agora se tornaram “potencialmente” vagabundos, marginais e um sem fim de
nomenclaturas para configurar a nova condição em que se encontram.
Ora, pois que temos que nos dias
atuais, não é muito diferente da realidade vivida pelos camponeses daquela
época, pois que o nosso sistema capitalista é incapaz de absorver toda a mão de
obra disponível para a relação direta com o mercado e a economia de maneira geral.
Também
me parece óbvio que não necessariamente a potencialidade do ser humano agora
desprovido de manter sua subsistência, tornar-se um marginal [grifo nosso], efetivamente se tornará pois que esta
questão envolve dimensões psíquicas, psicológicas e tantas outras
subjetividades atreladas a forma ontológica do ser.
Então porque resolvi explorar essa
questão? Penso que a problemática envolvida no processo perpassa não somente
pelo modelo econômico no qual estamos inseridos, mas também em grande parte ou
em certa medida pela interpretação de nossas leis e afirmo que o problema não
se encerra na mesma pura e simplesmente por possíveis fragilidades que possam
apresentar, mas também entendo que os magistrados em nosso país, têm alguma
dificuldade em lidar com situações diria numa dimensão teológica numa relação
de juízo de valor, pois que não existe “pecadinho e pecadão” e dessa forma, a
subjetividade na formação humana do magistrado poderia influenciar de maneira
substancial na interpretação da lei.
Em resumo: vale o que está escrito,
mas “normalmente” para os explorados expropriados e destituídos dos interesses
do sistema.
[1] Geraldo Ribeiro de Sá,
Juiz de fora- MG,UFJF,1996.
[2] Graduado em Ciências Sociais/Faculdade de Filosofia de
Campo Grande e Pós Graduado em Diversidade Étnica e Educação Superior/UFRRJ.
[3]
[...]as relações
econômicas, tornando-se presente, inclusive
nos intercâmbios travados entre capitalistas –proprietários dos meios de
produção e compradores de força de
trabalho, e os trabalhadores-donos de suas energias físicas e espirituais. A
coação surda, presentes nas relações econômicas e jurídicas, transparece,
inclusive nas demais “relações contratuais”, travadas no cotidiano do cidadão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário