sexta-feira, 13 de maio de 2016

Algumas considerações sobre educação, ciência e capitalismo: O que pode a psicanálise?

(Resenha) Por Ricardo Oliveira[1]

            Inicialmente, gostaria de destacar que este texto surge num momento muito oportuno, sobretudo do ponto de vista da atual conjuntura pela qual passa a realidade da educação no Brasil e com destaque para as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo.
            O tema central correlaciona a psicanálise com educação, saúde e o capitalismo dando ênfase para o que a autora denomina de ¨saúde da educação¨.
            Segundo sua concepção, a educação não anda muito bem por entender que o pragmatismo que pavimenta esse setor, tende a renunciar a um modelo de ensino que deveria explorar melhor um modelo educacional voltado para o campo das humanidades, comtemplando disciplinas como Filosofia e Sociologia, por exemplo, conhecimentos estes evidenciados nos seminários de Lacan[2]
             Não obstante, mais do que formar sujeitos sob a égide do capitalismo ou seja, mão de obra barata, formar um sujeito pensante, crítico e reflexivo aqui e no mundo,  e para o resto do mundo em suas palavras:

¨Mais do que formar mão de obra barata, a formação do sujeito deve ser priorizada. Aqui e no mundo. Partamos das ideias de que as elites são avessas a que as massas pensem isto é, aprendam a refrear seu gozo¨(BARROS,2015.pg 97).


            Para leigos pode parecer confuso, mas, de alguma forma ou em certa medida, a educação é consequência da castração da energia pulsional, ou seja, impulsos ¨naturais¨ sobre nossos corpos.
            Segundo a máxima Freudiana, educar, governar e psicanalisar são profissões impossíveis, porque em sua concepção, lidam diretamente com a castração do sujeito isto é, criam moldes e mecanismos, digamos norteadores de comportamentos mais elaborados, sistemáticos ou a quem preferir, contidos, castrados.
            Dito isso, temos a concepção de que a psicanálise é um produto da cultura dos mais sofisticados e que possibilita por assim dizer, uma espécie de controle sobre o sujeito a fim de conter suas descargas emocionais imediatas, criando tolerância à frustação de sentidos assim descrito:

¨Sendo a psicanálise um dos produtos mais sofisticados da cultura, ela o é, sobretudo porque possibilita aos sujeitos o aumento de seu limiar de tolerância para a frustração sem recorrer à descarga imediata, já que coloca nesse lugar o pensamento, a elaboração, a ligação da carga energética às palavras¨( BARROS,2015.pg 97).
           
            E ainda, segundo Freud a psicanálise seria uma espécie de ¨pós-educação¨ uma espécie de reeducação, uma segunda chance de aumento da capacidade crítica e de eficiência, com a finalidade de definir parâmetros mais confiáveis de seguir em frente na vida, superando obstáculos com maior eficácia.
1.1  O uso da ciência contra a educação
            A ciência que se desenvolveu a partir do renascimento cultural tinha como objetivo principal, a superação de mazelas e suas causas, ou seja, o desenvolvimento de um conforto maior na vida. Resumidamente, um controle da natureza em detrimento do desenvolvimento da humanidade. O homem desenvolveu máquinas e tecnologias e identificou-se com esses instrumentos.
            Dessa forma, o campo da educação não ficou alijado da influência que o capitalismo fez/faz ao usar descobertas cientificas em seu próprio beneficio sobretudo com a intenção de obter lucro. Faz-se necessário acrescentar que para obtenção do lucro pretendido, o sistema precisa de ferramentas e dentre elas o uso da mídia é essencial, pois deve haver demanda de ¨necessidades¨.
Ora, nas palavras da autora: ¨Palavras quebram ossos, vendem ilusões, criam demandas, mas também, como faz a psicanálise, curam, despertam, fazem o sujeito ¨cair na real¨ (BARROS,2015.pg 100).
E ainda: ¨Sabemos o quanto a infância tem sido adoecida, crianças medicadas por serem apenas crianças, numa proliferação de diagnósticos com consequente administração de psicofármacos¨. (IDEM)
            Pensarmos estas questões associadas aos interesses do capital, nos leva a crer que, não obstante, a psicanálise passa pelo crivo de remediar demandas no seu campo de atuação. Mesmo Freud foi acusado de atender a estes interesses, visto que a psicanálise sempre foi vista como tratamento elitista, caro, ou seja, para poucos e que visava basicamente a adaptação do sujeito ao status quo.

1.2 Sobre o capitalismo
            O sistema capitalista possui em seus meandros estratégias e instrumentos capazes de fazer com que através do mercado/consumo, indivíduos acreditem que algo desenvolvido pela ciência é capaz de satisfazer seu desejo/¨necessidade¨, tornando ¨produtos¨ essenciais para sua sobrevivência.
            Ao contrário do discurso desenvolvido por Lacan[3], o pensamento desenvolvido pelo capitalismo evidencia a promessa de eliminação de necessidades criando objetos de desejos para dessa forma, angariar cada vez mais fundos para fomentar e manter o sistema.    
            Dessa maneira, o que passa a existir constatado por Lacan passa a ser o discurso capitalista em que o homem deixa de ser gente e passa a ser servo do capital, dessa forma tornando-se mero instrumento no processo de produção como diria Marx[4] ¨coisificado¨ dito em outras palavras:

¨Não há liberdade alguma, o homem não tem outra escolha que não seja submeter-se à lógica do mercado, oferecendo seu próprio corpo para implemento de um gozo a mais(mais-valia) para o capitalista.¨ (BARROS,2015,pg103)

            Nesse sentido, é um discurso atrelado ao da perversão uma vez que transforma cada um em objeto de seu gozo, ou seja, transforma o individuo em ser desejante, mas que responde somente aos interesses do outro neste caso o capital.
            Sendo assim, o discurso de um analista torna-se comprometedor, pois é capaz de antepor-se ao discurso do sistema.
1.3  A psicanálise e a educação

            Sigmund Freud sabia que a educação era o instrumento capaz e necessário que possibilitava ao ser humano aprender a controlar e adiar as satisfações oriundas das pulsões que tem por objetivo como dito por Lacan, inibir, suprimir até mesmo proibir de colocar em prática todos os impulsos.
            Ainda segundo Lacan a formação humana (a educação formal) possuiu em sua essência e não ao acaso refrear o gozo, ou seja, resumidamente suprimir o princípio do prazer versus o princípio da realidade.
            Dessa maneira, o psicanalista deve pensar que a educação é capaz de controlar aspectos destrutivos promovidos pela pulsão, pois que esta busca incessantemente a satisfação e o gozo destituídos de obstáculos construídos sistematicamente.
            Não obstante, em linhas gerais para quer possamos obter uma existência confortável e soberana do ponto de vista dos sentidos que damos as coisas, para uma boa convivência entre os iguais, o refreamento do gozo e o subsequente mal-estar que possa ser ocasionado por tal evento, é o preço que devemos pagar
indubitavelmente por conta da manutenção de convivência e sobrevivência dentro de uma cultura civilizada.
            Em suma tendo-se a castração do sujeito através da educação a fim de refrear seu gozo, amplia-se a capacidade de reter, poupar e administrar melhor seus comportamentos subjetivos nas palavras da autora:   ¨Evita-se o desperdício de vida¨(BARROS,2015,pg 105).
            Relembrando Freud em seus escritos sobre Mal-estar na cultura, ele observou que as massas via de regra, são pouco propensas a adiar seus gozos pulsionais (pessoais) e que de certa forma por vivermos em uma sociedade societária, acelerada por processos midiáticos, tecnológicos/digitais, cada vez menos toleramos esse adiamento pulsional, e temos como consequência disso, a destruição, a violência contra o outro, o diferente. Leia-se: negros, pobres, indígenas, ciganos.
            Dito isso, revela-se que a educação não pode efetivamente dizer que efeitos e resultados pode obter de antemão, mas certamente revelará ao indivíduo a possibilidade de um agir mais propenso a cautelas oriundas de suas construções mentais visto que este colocará a frente de seus impulsos iniciais recursos de funcionalidade e objetividade em suas ações.



           



           
           

           
                       



[1] Graduado em Ciências Sociais/Faculdade de Filosofia de Campo Grande e Pós Graduado em Diversidade Étnica e Educação Superior/UFRRJ.
[2] Lacan estudou no colégio Stanilas, dirigdo por jesuítas, escola particular que atende à alta burguesia de Paris.
[3] Os discursos desenvolvidos por Lacan consistiam no estudo das seguintes categorias que se seguem: o da histérica, o da universidade, o da ciência e o do analista.
[4] Ler a obra ¨ O Capital¨ de Karl Marx.

Nenhum comentário:

Postar um comentário